terça-feira, 22 de março de 2011

Unidade I - O tempo das Ciências Naturais e o tempo da História

1.    Os historiadores e o tempo:
Apesar dos historiadores definirem sua prática em função do manejo da categoria tempo (cita o exemplo de Bloch para o qual a “história é a ciência dos homens no tempo”). pouco se reflete, em termos metodológicos sobre o uso desta categoria. Via de regra o tempo é tratado muito mais como objeto de estudo - tipo as formas como as diferentes sociedades históricas concebem o tempo, ou a dimensão cultural do uso do tempo e suas representações - . O que se deixa de lado é : “como lidar com a categoria ou o parâmetro temporal na pesquisa histórica”
Nas ciências sociais o tempo também é trabalhado de diferentes maneiras desde os tempos da economia, marcados por parâmetros teóricos (t1 e t2), passando utilização do tempo pelos geógrafos, especialistas em espaço, chegando até a antropologia estrutural que concebe o tempo como código, o consenso metodológico está longe de existir. Dentre os próprios historiadores a categoria tempo, surge em diferentes acepções
Braudel: “O tempo imperiosos do mundo”
Villar: o tempo como um produto da História(jogo das relações sociais no seio das estruturas.
2.    O tempo dos físicos e dos filósofos:
Mudanças no quadro científico e filosófico do século XX, associado às teorias da relatividade e ao desenvolvimento da física quântica, transformam substantivamente a elaboração da categoria tempo que de “absoluta” passa a ser “relativa”.
a) O tempo como uma categoria absoluta:  dominada pelas concepções newtonianas, se estende desde fins do século XVII até final do XIX. A passagem do séc. XIX para o XX seria considera da de transição.
FISICA l: Tempo absoluto desvinculado da matéria: “substância especial imutável, autodeterminada, ontologicamente independente da matéria, de estrutura uniforme em todo o universo, caracterizada por pura duração
FILOSOFIA: Discussões sobre o tempo estiveram presente entre as correntes de cientistas e filósofos do século passado. Dentre estas três se destacam tanto pela sistematização como pela coerência das idéias.São eles Emmanuel Kant (1724-1804); Henry Bergson (1859-1941) e o marxismo.
Kant: tempo e espaço se definem como formas apriorísticas da percepção sensorial, seriam considerados elementos inatos do sistema cognoscitivo. Antecedem e existem independentemente de qualquer conteúdo.
Bergson: Sua idéia fundamental era que o tempo real tem como essência a pura duração, decorrente da continuidade da vida interior do indivíduo. (...) a duração é subjetiva imanente a consciência.
Marxismo: Relacionado ao período de transição ao século XX, quando as questões sobre a matéria e movimento já faziam parte do elenco de debates científicos. Para o marxismo tempo e espaço são formas de existência da matéria em movimento. “a existência do tempo se vincularia à transição do ser ao não ser e vice-versa, ao aparecimento do que é qualitativamente novo, desaparecimento e transformação das coisa e estados”(p.29).
b) O tempo como uma categoria relativa: ligada à mecânica quântica e a teoria da relatividade. Abarca o século XX.
Marcos de referência para a crise do paradigma newtoniano sobre o tempo.
Teoria da relatividade exposta por Einstein entre 1905-1916.
O surgimento da mecânica quântica 1900
Conhecimento da estrutura do átomo 1911-1913.
Einstein e a relatividade: Não existe tempo e espaços absolutos. O tempo está ligado ao espaço.
Para as ciências sociais e História, em especial, a teoria da relatividade rompe com a idéia de tempo absoluto relacionando-o à matéria. Rompe com a concepção idealista do tempo propondo uma abertura para o materialismo
3.    Os problemas específicos da organização da temporalidade em História: haverá alguma relação com o que ocorre nas ciências naturais?
3.1. O tempo no trabalho dos historiadores:
Caracteriza três reflexões sobre o trabalho do historiador sobre o tempo, dentre os poucos citados anteriormente.
Sergio Bagú : propõe 3 dimensões pertinentes ao estudo dos “seres humanos organizados em sociedade” -
a) Tempo - seqüência ou transcurso
b) Tempo - raio de operações ou espaço.
c) Tempo - transformação e riqueza de combinações ou intensidade.
Para o autor a existência social se da em três dimensões com ritmos variáveis.
Robert Berkhofer Jr.: caracteriza duas dimensões presentes no manejo do historiador com a categoria - dimensão externa, o tempo físico, passível de mensuração; dimensão interna, tempo subjetivo.
O primeiro, ligado aos processos de datação, seria o tempo linear e irreversível, matemático e externo ao que acontece internamente.
O segundo é entendido como o tempo cultural, como as diferentes sociedade manejam com a categoria tempo e a concebem na sua vida social.
Estabelece 5 questões básicas que o historiador deveria atentar ao operar com a categoria tempo, a saber:
1 - a delimitação da seqüência estudada
2 - a ordem da seqüência em relação ao tempo
3 - a razão da ordem de ocorrência
4 - a localização da seqüência no tempo (por que aconteceu naquela época e não em outra; por que não ocorreu então outra coisa)
5 - ritmo da transformação durante a seqüência examinada
Escola dos Annales: relação passado presente, fim da idéia de continuidade, politização da temática histórica a partir de reflexões próprias ao tempo do historiador.
Depois de expor estes três pontos de vista sobre a operação histórica com o tempo, buscará relacionar as transformações epistemológicas no campo das Ciências Naturais com a História
3.2. Periodização: As propostas de periodização da história também são marcadas pelo debate filosófico entre convencionalistas e realistas
realistas: a periodização provém da própria natureza do objeto de pesquisa: os períodos estabelecidos de maneira adequada seriam um reflexo fiel da realidade histórica.
convencionalistas: já que a história é um devir, um movimento contínuo e ininterrupto, qualquer periodização é arbitrária, podendo justificar-se unicamente por razões didáticas ou pragmáticas.
Em geral, a postura convencionalista é criticada pelo seu viés idealista, propondo-se em substituição, uma perspectiva realista que não recaia num materialismo vulgar e estreito:
“Se o tempo é apenas uma forma de existência das coisas e não uma coisa em si, é lógico que seja ordenado segundo os conteúdos e que, assim, possa ser concebido como algo homogêneo tanto quanto heterogêneo, descontínuo tanto quanto contínuo. As diversas periodizações possíveis não se equivalem: deverão ser julgadas segundo sua pertinência em relação aos conteúdos concretos, que se trata de periodizar de acordo com algum quadro teórico”(Cardoso, 1988, p.32)
3.3 Causalidade e determinação: a irreversibilidade do tempo.
Até o final do século XIX a ciência esteve dominada por uma concepção de determinismo mecanicista. Em história o determinismo vulgar teve como representante o positivismo, que tomava como referência de tempo uma causalidade linear onde fatos encadeados explicariam a História, ou ainda, seriam a própria História. Hoje tal noção foi substituída pela noção de causalidade estrutural, onde a sociedade é concebida como um todo estruturado. Tal transformação no ponto de vista do historiador está relacionado às mudanças no paradigma científico, no século XX, através da substituição do determinismo vulgar, pela noção de probabilidade e contingência. O modelo indutivo, com forte apelo empiricista, foi substituído pelo hipotético dedutivo, cujo pressuposto é a partir de leis gerais, reconhecer e explicar os fenômenos da natureza. Em termos de conhecimento histórico trabalha-se também com a noção de abdução, ou seja, a partir da análise de indícios, aplica-se um quadro referencial mais amplo, a partir do qual os fenômenos são explicados. Importa aí a noção de possibilidade e probabilidade.
3.4 A multiplicidade do tempo histórico:
Como já foi relatado nas posições anteriores, existe uma espécie de consenso atual em considerar o tempo da história como múltiplo. Dentre estas colocações a que, até hoje, desde 1958 quando foi publicada, é a Fernand Braudel, responsável pela continuidade da Escola dos Annales depois de M.Bloch e L.Febrve. Tal concepção diz respeito aos três tempos da História, a saber:
- O tempo da curta duração, do evento, do fato.
- O tempo da média duração, das conjuntura, ciclos econômicos.
- O tempo da longa duração, das estruturas mentais, econômicas, simbólicas etc.
Discute ainda a idéia de densidade temporal, períodos de aceleração da História, etc. ligados à problematica do historiador e ao movimento das sociedades.

Resumo baseado no texto:
Cardoso, C.F.S. “O tempo das Ciências Naturais e o tempo da História”, IN: Ensaios Racionalistas, RJ, Campus, 1988, pp. 25-40.

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