terça-feira, 22 de março de 2011

Unidade II. História da História: Os diversos regimes de historicidade/ Saber e poder no mundo medieval

II. História da História: Os diversos regimes de historicidade
Saber e poder no mundo medieval

A história cristã
Avaliação historiográfica sobre a Idade Média: Contraditória.
v                  Perspectiva histórica marcada pela ruptura com o pensamento cíclico da Antiguidade: história teleológica – história como marcha da humanidade.
v                  Outros autores defendem a perspectiva oposta: impossibilidade da mentalidade medieval em pensar a história como um devir e no domínio persistente das representações cíclicas milenaristas.
Pontos importantes a destacar: extrema variedade de gêneros históricos praticados desde a Alta Idade Média e o nascimento de uma “consciência ativa da história” ( a partir do século XII) que todavia não liberta sua subordinação à teologia; existência de  uma consciência comum do tempo que impões sua marca à atividade dos historiógrafos.
  1. Nascimento da história cristã na alta Idade Média.
1° gênero: produção hagiográfica, quer se trate de vida dos santos, de relatos de milagres ou de translações de relíquias, ou finalmente listas episcopais. A partir de então, os altos feitos de Deus e dos seus servos ocupam o primeiro lugar na cena histórica – período carolíngio.
Estrutura da narrativa adotada: Um modelo familiar, o do pai que alimenta, encarregado de zelar pelo patrimônio, estrutura o relato em profundidade. Estabelece-se assim o primado do arquétipo sobre o facto de observação, que vai marcar por muito tempo a historiografia medieval.
2° gênero: Anais e as crônicas. Os primeiros relatam secamente os fatos ano a ano e dão um bom lugar aos acontecimentos políticos e militares, contudo esses anais são na maioria das vezes escritos em mosteiros e trazem a marca da preocupação de seus autores. Quanto à crônica é à partida um gênero com pretensões muito amplas- descrever e explicar a partir da fé os acontecimentos . Exemplo de cronista: Gregório de Tours.
3° gênero: biografias ou autobiografias, também inspiradas em obras antigas, contudo a adaptando o relato ao modelo cultural carolíngio, ou seja de um humanismo devoto impregnado de tradição latina.
Perspectivas de mudança no regime historiográfico a partir do século VI, neste o passado se torna um repositório de elementos para fundamentar a narrativa religiosa.

  1. Pode-se julgar, contudo que os autores da alta idade Média ( alargada até o século XII) dão provas de uma ausência geral de sentimento histórico? E, se sim, quais podem ser as razões? São contingentes ou estruturais?
Afirma a partir de algumas considerações feitas por outros autores que a mentalidade medieval era a-histórica: “Mas a razão profunda pela qual a mentalidade medieval pôde ser  considerada como “a-histórica” poderia igualmente residir no facto de que a história neste período não é realmente apropriada pelo homem. Não passa de aplicação dos desígnios divinos sobre a humanidade. Assim, o gênero  hagiográfico exerce todo o seu peso sobre o gênero histórico, com risco de se confundir  com ele.
Identidade entre hagiografia e historiografia no período medieval: Os dois gêneros se preocupam com autenticidade e veracidade dos fatos, sempre rodeados de todas as garantias de lugar e de data. Perseguem o mesmo objetivo: evitar que os  fatos notáveis caiam no esquecimento.
Diferenças estruturais entre hagiografia e historiografia:
Hagiografia: não recolhe necessariamente os fatos verdadeiros, mas “constitui” a verdade de fenômenos maravilhosos rodeando-os de todas as garantias desejáveis. Não se pauta numa cronologia, mas num conjunto de fatos ou provas para validar uma instituição ou legitimar um culto. O tempo circular da liturgia exerce sua atração sobre a hagiografia
Historiografia: A crônica, em contrapartida, registra fatos verdadeiros, a par de outros mal estabelecidos. Em termos de visão de tempo, por mais providencialista que fossem os historiadores, definem a história como um relato verdadeiro, baseado na cronologia. O sentido de duração marca a história.
A identificação mais clara será entre história e teologia, posto que esta última, propõe uma visão unificadora e orientada da história.

  1. A teologia ao serviço da história (muito particularmente no século XII).
Século XII a teologia marca a perspectiva  da história como a representação do povo cristão em marcha para a sua beatitude.
Características da escrita da história até o século XII: Sto. Agostinho história e sentido, gradual  substituição da perspectiva cíclica  dos pensadores gerco-romanos. No entanto, a perspectiva de tempo ainda não está no domínio dos homens: “Até o século XII, pode falar-se de uma ampla indiferença pelo tempo, que é concebido e vivido essencialmente como tempo natural ( ciclo das estações e dos meses) e como tempo litúrgico (organizado também em cadências fixas).
Os acontecimentos históricos interessam mais pela sua importância simbólica do que  pelos seus antecedentes e seqüências. Contudo, um sentido novo do tempo vai despertar no século XII, por conta das transformações históricas associadas ao desenvolvimento geral das trocas e o florescimento de uma cultura urbana. Nesse novo contexto, o homem  assume um papel ativo diante da natureza, transformando-a  através do seu trabalho.

Nasce também uma nova visão de história baseada nas seguintes características:
v      Providencialismo
v      Noção confusa de progresso em história pautada no domínio das instituições religiosas e valores morais.
v      Seqüencialidade dos acontecimentos que criam uma narrativa de natureza teleológica.
v      Elaboração conceitual do tempo: para estabelecer uma periodização para a aventura humana

  1. Visão da história e sentido comum do tempo.
Estabelece um conjunto de três fontes para avaliar uma perspectiva comum de tempo: relato de peregrinação; inquéritos judiciários; iconografia – domínio do passado mal assegurado, utilização dos advérbios, outrora e há muito tempo; confluência do eterno presente do tempo religioso e dos acontecimentos contemporâneos do fim da idade Média


Os cronistas dos séculos XIV e XV

1.       Froissart, arauto da sociedade cavalheiresca declinante.
Valoriza o comprometimento deste com a visão aristocrática e a total parcialidade do seu relato; caracteriza o método do cronista  com base na busca da verdade e da autenticidade dos relatos, associados ao testemunho – valorização dos relatos orais
2.       Os cronista na dependência dos príncipes (século XV)
A dependência dos historiógrafos em relação aos príncipes é grande, criando uma expectativa em relação ao trabalho do cronista pautada em dois princípios: exaltar os feitos do príncipe e manter a coesão dos estados.
Limites da narrativa memorialista para a visão de história do final da Idade Média: estreiteza do campo de visão (limitada aos fatos militares e à vida na corte numa soberba ignorância sobre o povo); uso do estilo nobre expresso por uma escrita empolada; obrigação de tomar a defesa do príncipe ou mecenas.
3.       Uma percepção diferenciada das realidades políticas e militares.
Vida efusiva das cortes
Relato contrastante das guerras.
4.       A história, veículo privilegiado do sentimento nacional.
Ainda calcada na gesta dos reis sem dimensionar o papel do povo.
5.       Avaliação geral da história na Idade Média, segundo Bernard Gueneé:
v                  Tinham uma visão clara de história como um relato simples e verdadeiro
v                  Só fixam os fatos (gesta) realizados por atores eminentes.
v                  A história não é uma disciplina autônoma é uma ciência auxiliar da moral e da teologia. Somente ao final da Idade Média adquiria uma certa autonomia.
Variedade dos tipo de historiadores:
v                  Monges guardiões dos manuscritos e dos livros dos mosteiros
v                  Historiador das cortes e das praças
v                  Histriador de gabinete: figura típica do final da baixa idade média, associado aos primeiros trabalhos de erudição.
Tratamento das fontes pela idade Média:
v                  Valorização do relato oral e o seu registro
v                  Organização de bibliotecas
v                  Divulgação do conhecimento pela imprensa.


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